Júlio Almas, funcionário da Câmara do Seixal (PCP) há 17 anos, perdeu a paciência com os alegados atropelos aos seus direitos laborais, o que, a confirmar-se, contraria todo o discurso dos comunistas em defesa dos trabalhadores.
Segundo fontes camarárias, Júlio Almas - que se recusou a falar ao DN, alegando estar o caso em segredo de justiça - apresentou esta semana uma queixa na Inspecção-Geral da Administração Local (IGAL) e informou todos os vereadores, bem como as centrais sindicais (CGTP e UGT) e o Sindicato dos Trabalhadores da Administração Local (STAL).
Impedimento de entrar nas instalações da câmara e subsequente marcação de 63 faltas injustificadas, não atribuição de trabalho ou funções, impedimento de promoção na carreira e de fazer horas extraordinárias, perda de subsídio de turno sem justificação, são algumas das práticas alegadamente cometidas pelas chefias de Júlio Almas e que constam do documento por si enviado, em Dezembro passado, ao presidente da Câmara do Seixal, Alfredo Monteiro.
A autarquia respondeu ao DN por escrito: "A Câmara Municipal do Seixal não divulga quaisquer dados que digam respeito à gestão dos seus recursos humanos. Tendo em conta que as questões colocadas se enquadram todas nesta matéria, entendemos que não há lugar a respostas directas, nem nos cabe tecer quaisquer comentários sobre o assunto."
Na carta enviada a Alfredo Monteiro, a que o DN teve acesso e onde se dá a entender que haverá vários outros "trabalhadores perseguidos, injuriados e desprotegidos", Júlio Almas escreveu: "(...) trabalhador exemplar (conforme classificação de serviço), vejo a minha situação laboral transformada num autêntico inferno dantesco", com consequências "resultantes de penalizações consecutivas perpetradas por esta Câmara."
"Compreendo que se queira mostrar uma câmara exemplar, onde os direitos dos trabalhadores são sempre consagrados por uma política democrática e humanitária. Mas considero inadmissível que, perante os constantes atropelos dos direitos de um trabalhador inconveniente, se proceda ao seu saneamento por intermédio de manipulação, só para mostrar que nesta Câmara [onde o PCP tem maioria absoluta] tudo vai bem", declarou Júlio Almas - que foi candidato à junta de freguesia do Seixal pelo Bloco de Esquerda.
"E isto tudo com a atitude letárgica e conivente do sindicato para o qual deduzi um por cento do meu ordenado durante 17 anos consecutivos", adiantou o funcionário, informando Alfredo Monteiro de que iria enviar uma cópia da carta "a todos os vereadores" da Câmara, ao STAL e ainda às duas centrais sindicais, CGTP e UGT.
O STAL também é visado: "Por não entender a razão pela qual o sindicato não agiu em conformidade com os seus princípios de defesa, justiça e direitos no trabalho, decidi procurar a resposta para os seus actos de subserviência ao poder executivo camarário."
"Decidi saber porque 17 anos de pagamentos de quotas, manifestações e greves que perdi a conta, só significaram desprezo (...). Sei, agora, que alguns dos delegados sindicais do STAL colocados na Câmara do Seixal são, ao mesmo tempo, autarcas e ou candidatos representantes" do PCP.
"Considero inadmissíveis existirem delegados sindicais que, quando estão representados pela força política vigente, defendam os interesses do patronato como seus interesses", bem como "os continuados actos de servilismo patronal, para fazer prevalecer os ideais políticos dos cidadãos e trabalhadores delegados sindicais (...), mesmo que isso signifique o afastamento de trabalhadores inconvenientes. Trabalhadores que, mesmo inconvenientes, têm direitos e regalias, como qualquer trabalhador", frisou Júlio Almas.
(Diário de Notícias de 23 de Janeiro de 2011-01-23)